Um olhar feminino faz a diferença? Claro que sim. O jeito com que uma mulher pode fazer uma determinada tarefa é o grande diferencial. Se isso for profissionalmente, então, nem se fala. No segmento de administração condominial isso é cada vez mais notório.
Não são dados oficiais, mas hoje estima-se que o número de síndicas moradoras ou profissionais deve girar em torno de 39% do total de pessoas nessa função. Isso tem feito a diferença. Muitos condôminos, prestadores de serviço e equipe acreditam que uma mulher, nessa atividade, tem um jeito diferente de gerir um prédio.
Hoje, a Habita conta, entre os prédios que administra, com um percentual alto de mulheres como síndicas, sejam moradoras, sejam profissionais. Atualmente, cerca de 117 prédios tem uma mulher no comando.
Para comemorar o Dia Internacional da Mulher (8 de março), homenageamos moradoras e síndicas – e todas as mulheres que precisam provar cotidianamente sua força. Ouvimos algumas dessas síndicas para entender o dia a dia, as dificuldades, os preconceitos e, principalmente, suas maiores conquistas no exercício dessa função.
Administrar egos é mais caro
Mesmo com esse diferencial, muitas síndicas, sejam moradoras ou profissionais, dizem que tiveram que batalhar muito para conquistar o respeito. “Estamos falando de um setor que tem muitos homens. Cerca de 80% de prestadores de serviço são homens, assim como zeladores, porteiros etc. Isso sem contar os moradores. Uma das grandes conquistas em minha profissão é o respeito que tenho hoje de todos. Isso veio ao longo dos anos, mostrando muita determinação e compromisso com meu trabalho”, afirma Marta Pachioni Monteleone, que é sindica profissional há 22 anos. Antes, foi síndica do prédio onde mora.
“Houve, sim, muito preconceito no começo. Ver uma mulher em uma função que era vista como de ‘homem’ não era fácil. As maiores resistências que encontrei foram, sim, de prestadores de serviço, mas, principalmente, de conselheiros, muito em razão de eles verem que eu conseguia resolver questões que eles não conseguiram”, diz Marta que, hoje, administra dez condomínios comerciais e residenciais, com cerca de 800 condôminos.
Segundo ela, sua maior satisfação com a profissão, o que a mantém nesse segmento há 22 anos, é gostar de montar e manter equipes. Fazer com que a equipe trabalhe corretamente. “Sou vista como exigente, severa, mas o que sou é justa. Quando percebo que pode dar problemas, eu digo que meu preço para administrar egos é bem diferente do que para administrar o condomínio.”
A mulher ganha mais espaço e preferência na escolha do profissional
Márcia Camargo é síndica profissional há 18 anos e administra 20 condomínios, com cerca de 4 mil condôminos. Conforme ela, essa é uma atividade que a motiva, pois são novas experiências a cada dia.
“Todos os dias é um novo desafio. Se ‘mata um leão por dia’ e muitos condôminos nem percebem isso. Eles não têm ideia disso, mas, confesso, isso é motivador. Nesse ponto, o lado mulher ajuda muito. Posso até afirmar que muitos prédios até preferem que esse profissional seja uma mulher, pois temos um olhar mais crítico sobre as coisas. Temos a capacidade de desenvolver várias coisas ao mesmo tempo. A mulher já entra no prédio olhando, fiscalizando e apontando tudo”, conta.
Mas ela diz que nem tudo são flores. “Ainda temos uma barreira forte, que é mais de costume do que qualquer outra coisa, pois a mulher ainda precisa conquistar seu espaço. Vejo muita dificuldade, por exemplo, em entrar em condomínios com uma predominância de moradores de um determinado país cuja mulher ainda é vista de maneira subserviente. Essa barreira cultural é difícil de ser quebrada.”
Como a grande maioria dos profissionais, ela também começou como síndica do prédio em que morava. Pouco mais de um ano na função, foi convidada por um amigo para administrar um novo prédio. Aí, começou na profissão. “Esse reconhecimento como profissional é meu maior ganho. Ser vista como uma profissional efetiva e que traz bons resultados é minha maior conquista. Fui caminhando prédio por prédio e geralmente por indicação, sejam administradoras, construtoras ou condôminos”, assegura.
A jornalista que virou síndica
Depois de 14 anos atuando como jornalista e ter sido síndica do prédio no qual mora, Roberta Migliolo Santos resolveu mudar de profissão. Se especializou e se tornou síndica profissional. Hoje, com três anos de mercado, administra quatro condomínios residenciais, com cerca de mil moradores.
Ela diz que essa experiência profissional a ajuda muito, pois a comunicação é essencial na sua função. “Na minha profissão, a comunicação é fundamental. Trago essa experiência que tive antes para essa atividade. Tenho canais diretos com os condôminos, via WhatsApp, informativos periódicos, eventos, redes sociais etc. Isso ajuda muito no dia a dia”, explica.
Ela conta que criou um informativo “Chame a Síndica” (que também é uma hashtag que ela usa muito em suas comunicações) e que tem funcionado como um importante canal de comunicação. “Até eventos em condomínios temos feito, usando esse meu ‘slogan’. Isso estreita a relação.”
No que diz respeito ao dia a dia da profissão, Roberta é o tipo de síndica que coloca a mão na massa, mesmo grávida. Ela teve filho recentemente, mas durante a gestação foi preciso, por exemplo, até subir na caixa d’água para resolver um problema. Sem medo e com todo equipamento de segurança necessário.
Por estar na profissão há relativamente pouco tempo, ela acredita que o preconceito com uma mulher na função não é tão grande. “Percebo em algumas coisas pontuais, como uma obra. Mas a gente se posiciona e mostra que sabe o que está fazendo. Nunca sofri preconceito, mas tenho de mostrar que sei o que estou fazendo. A gente tem de chegar chegando”, garante.
“A mulher tem uma visão diferenciada e a gente acaba fazendo coisas que o homem não faz. O cuidado, o zelo – não que o homem não tenha – isso, na mulher, é mais forte. O homem não é tão detalhista. Eu, pessoalmente, sou muito chata, faço questão de acompanhar tudo e ver como é o trabalho das equipes.”
Ela conta que não é uma síndica que anda maquiada e de salto alto. Ela diz que vai de tênis, calça e, muitas vezes, até de bermuda. “Gosto de estar bem perto de tudo”, diz. Ela acrescenta que nunca sentiu preconceito, mas um certo estranhamento mais pela postura dela, não pelo fato de ser mulher, mas em razão de não se estar acostumado a ver um síndico atuando assim.
Roberta adiciona que faz questão de estar junto, sim, de agregar a equipe e usar todos os recursos disponíveis para isso. “As tecnologias e o acesso às informações são aliados fundamentais para isso. Posso não estar perto em pessoa, mas minha equipe se comunica comigo sempre. Assim como os moradores.”, avaliza.
Os dois lados do balcão
Liliane Machado Moreira já viveu os dois lados do balcão. Durante mais de 15 anos trabalhou em administradoras de condomínios, como gestora. Há três anos resolveu mudar de lado e passou a ser síndica profissional. Hoje, ela cuida, com um sócio, de dez prédios residenciais, com cerca de 2,1 mil condôminos.
Para ela, essa experiência ajudou muito em sua profissão, lhe deu uma visão diferenciada da administração, sabendo na prática como lidar com todas as frentes que um síndico cuida no dia a dia.
“Eu nunca senti um tipo de dificuldade com relação ao fato de ser mulher. Acredito que minha experiência anterior como gestora tenha sido importante para isso. Claro que existem pessoas machistas que pensam que uma mulher não teria a mesma facilidade. Mas eu nunca senti isso. Muito pelo contrário, até pelo fato de ser mulher e pela forma com que trabalho, já tive indicações de condomínios com os quais trabalho para gerir outros prédios. Mais ainda, tenho clientes que fizeram questão de que o ‘síndico’ fosse mulher”, diz.
“A percepção de detalhes, que a mulher naturalmente já carrega com ela é o grande diferencial entre os gêneros. Não que o homem também não tenha, mas ele costuma ter uma visão mais macro. Isso faz diferença no mercado para que uma mulher seja vista de forma positiva.”
Segundo ela, não há gênero para a profissão. Ela não vê a síndica mulher ou o síndico homem, mas o síndico como profissão. Assim como médico, engenheiro, mecânico, entre outas atividades. “Não é o homem ou a mulher no exercício da função, somente uma palavra que define o profissional, não a pessoa. Não tem importância o sexo dele.”, defende.
O prédio é sua casa maior
Pode-se dizer que Suely Dandrea começou como síndica meio que sem querer. Na primeira assembleia do prédio em que morou, com oito unidades, uma por andar, decidiu-se que cada andar iria administrar o condomínio por dois anos. Quando chegou a vez da sua unidade, seu marido não pôde e ele passou essa responsabilidade para ela. Isso foi em 2001 e ela continuou por lá até 2004, quando mudou-se – e assumiu a mesma função no novo endereço.
Suely conta que teve, nessa primeira experiência, uma ajuda fundamental de seu subsíndico, que era advogado.
Pouco tempo depois, foi convidada para gerir um prédio vizinho do seu, por indicação. Aliás, ela conta que trabalha mesmo só por indicação e resolveu ter um número pequeno de prédios para cuidar. Hoje, são seis, todos residenciais, com um total de 120 unidades.
“Nunca senti discriminação por ser mulher e isso vem do respeito mútuo que tenho para com fornecedores, funcionários e moradores. Nunca tomo uma decisão sozinha, pois tenho um conselho por trás, que é a voz de todos os moradores, mas tenho autonomia.”, afirma.
A síndica conta que uma das grandes conquistas dela é poder criar vínculos com o moradores, mas que tem prédios que não conhece todos os condôminos. “Isso pode ser visto como um fator positivo, pois significa que não há problemas. O prédio deve ser visto como sua casa maior. Basta administrar bem como sua própria casa. Vejo, sim, os condomínios que administro como minha própria casa.”
Ela destaca um ponto crucial, que pode ser visto como um divisor de águas para a administração condominial: a pandemia.
“A pandemia veio para que a gente tivesse de reaprender a administrar. Nesse ponto, a tecnologia se tornou nossa aliada. Apesar de muitos moradores não gostarem e preferirem, por exemplo, receber boleto em malotes, o síndico criou o hábito de usar todas as ferramentas que tem à disposição, sejam as disponibilizadas pelas administradoras, como site e aplicativos, sejam e-mails, WhatsApp etc.”, enumera.
Por fim, ela destaca três qualidades que um síndico precisa ter: paciência, habilidade para lidar com pessoas e situações, e tempo. “Tempo é fundamental, pois os problemas não vêm com hora marcada.”
As conquistas estão nos resultados obtidos
Com 11 anos como síndica profissional, mas com experiência de ter sido síndica do prédio em que mora entre 2006 e 2014, Aline Mattar Marques entende que trabalho e dedicação são os diferenciais para qualquer profissional.
“Já passei por situação com pessoas que têm dificuldade em obedecer uma profissional mulher, mas mostrar que isso não é um problema é fundamental. Temos de demonstrar profissionalismo, como qualquer pessoa.”, garante. Hoje, ela atende cerca de 800 unidades.
De acordo com ela, suas maiores conquistas estão nos resultados obtidos ao longo do exercício de sua atividade. “Por exemplo, você pegar um condomínio com alta taxa de inadimplência e conseguir resolver isso é sensacional.”
Ela também computa como conquista o fato de ser reconhecida pelo mercado como uma empresária com independência e que trabalha com planejamento adequado para cada cliente.
“Poder mudar a história de um prédio, trazendo benefícios e melhoras para todos, é fruto disso: trabalho e planejamento. Como resultado, está o fato de você continuar atendendo o mesmo cliente durante anos e ser indicada por esses para outros. Isso é uma conquista muita grande.”, define.
Preponderante para isso, ela reputa o elo que tem com o moradores como fundamental. “Hoje, precisamos de um contato direto com o condôminos e um dos fatores que veio corroborar para isso foi a teologia, as ferramentas que temos às mãos. Sou totalmente adepta, pois facilita e acelera os processos e assuntos da administração.”, opina.
O mundo feminino e as vantagens para a gestão
Roseane Fernandes, que há dez anos atua como síndica profissional e, antes, durante oito, foi síndica moradora, atende, hoje, 13 condomínios, com um total de 3 mil condôminos. Para ela, o essencial na função é ser investigava e transparente.
Conforme ela, a função de síndico foi evoluindo, seja o morador, seja o profissional. “Quando me profissionalizei, há dez anos, o total de mulheres no mercado era em torno de 10% a 14%, isso foi crescendo. Ainda não somos maioria, mas crescemos na área.”
Para ela, a profissão por si só é desafiadora, mas temos um grande diferencial, pois o mundo feminino traz vantagens para a gestão condominial, quer pelo modo com que a mulher se comunica, com que trata os assuntos, que como entende os problemas e resolvendo-os.
“Temos uma visão diferente. Parece que somos mais investigativas e transparentes. Não que o homem se esconda, mas a mulher, pelo seu perfil, de ter mais facilidade de se expor, automaticamente, ela deixa os processos e procedimentos mais transparentes. As mulheres são melhores em finanças e mais bem preparadas, são mais versáteis.”, defende.
De acordo com ela, a mulher tem mais facilidade para gerenciar os vários pilares dos condomínios com mais facilidade que os homens, pois são mais polivalentes. “Esse conjunto de vantagens traz para os condomínios esse favorecimento com relação à inserção da mulher no mercado. Embora, a atividade é desafiadora por si só.”
Ela não teve muita experiência com relação à discriminação, mas principalmente quando era síndica moradora ela vivenciou situações em que conselheiros homens se colocaram como protetoras dela. Houve casos, segunda ela, em que eles se colocavam para resolver a situação com algum morador problemático. “Não podemos afirmar categoricamente que não existe preconceito, pois a profissão ainda é predominantemente masculina. Mas cada vez conquista mais espaço.”, conclui.
A mulher vem ocupando mais espaço no segmento. Ainda bem! O olhar e o jeito feminino de administrar fazem com que a gestão venha evoluindo. Parabéns a todas as síndicas. Feliz Dia Internacional da Mulher e que novas conquistas venham para o crescimento de nosso segmento.